29 de ago. de 2010

Mais uma canção

Sem pintura aparente
Sorriso crente
E coração demente
Desmente e sente
o prólogo dessa história, 
entrementes.
Não que não se tente
Não que não atormente
facilmente, 
Era um casal qualquer,
de mãos dadas,
olhando o [amor] poente.
  

Para ler ouvindo : Mais uma canção - Los Hermanos. 

25 de ago. de 2010

Colombina

Passo, passo, passo, pausa, sorriso.
 A chuva fina que banhava seus cachos artificiais, tão dourados quanto o sol nascente, entretiam os olhos de Pierrot, que assistia de longe.
 Suspiro.
Andando como se buscasse algo, ou alguém, por vezes perdia os olhos no horizonte. Os olhos que ele tanto amava, os olhos que vira crescer. Uma lágrima quente escorregou pelos olhos embevecidos do moço desajeitado da padaria ao ver, com pesar, o colorido arlequim tomá-la dos braços e girá-la num passo improvisado de dança, enquanto ela - igênua - era toda sorrisos, balançando a cabeça afirmativamente, se foi.
De mãos dadas com Arlequim.
Se foi.
E as minhas lágrimas tinham gosto de fel.   Volta pra mim, Colombina, volta pro seu Pierrot.

21 de ago. de 2010

GILDA II

Todos somos naturalmente pudicos. Por isso saímos para dançar à noite, como se não fosse deste meio, Gilda dançava ao meio dia, trajando preto da cabeça aos pés, sob o sol que despontava o fim do inverno. Gilda só existia em função do choque das mocinhas, das patroas, das empregadas, das infames e das hipócritas. Chocava a todas, com prazer, é claro .
Não dançava vulgarmente, como se poderia supor, nem era ballet clássico, tendo ares de louca.
Dançava bolero.
E dançava sozinha.
Há muito Gilda não sabia o que era dançar junto, mesmo quando junto, estava sozinha. Era sabido que nascera para a solidão, sendo dela filha única. Espiou por um momento por sobre o ombro, avistou o mesmo rapaz Johnny, o mesmo Johnny da biblioteca, eram tantos Johnnys e tantas Gildas que considerou por um momento antes de render-se e com um maneio de mão e dos lábios rubros chamá-lo para dançar.
Não sorriu, nem disse "Oi", apenas estendeu a mão e pontuou, esclarecendo o que não pertencia a claridade:
- Estou esperando meu príncipe. - Hesitou, por um instante e tendo as mãos do moço Johnny nas suas, pôs-se outra vez a dançar, com ele.
Agoram eram dois no contraste da realidade, eram dois e não uma só, eram dois, eram um alívio. Eram três, no por fim. Eram três porque o pudor alheio não os abandonara, eram três e Gildas eram mil, bem como Johnnys, quantos eram afinal ?

18 de ago. de 2010

GILDA

Retocou o batom, carmim, como as unhas, todo resto era preto no branco, cabelo, roupa, sapatos. Mas era na confidência da pele pálida, que silenciava os segredo dos toques que sonhara. Há muito não sonhava, dormia, também, branco no preto. Mas tendo ele voltado para a sua vida, voltaram as mazelas, as dúvidas e as noites de calefação da pele pálida .
Não o queria mais, não o tolerava, mas sua pele, suas células - também vermelhas, também vulpinas - o queriam, e não podia conter esse querer carmim que berrava-o. E todo o resto a queimava, e não importavam mais os maços de cigarro que queimava a fio, tentando dizer que não, não, não era ele. Era só a merda dos hormônios.
Os sapatos ditavam um ritmo cadenciado pelo assoalho de madeira, queria sumir com os pensamentos, por isso estava ali. Livrarias eram sempre a solução do que era indissolúvel, segurou um exemplar comentado de " O príncipe " entre os dedos, os nós se faziam esbranquiçados, apertava-o com mais força que o necessário.
- Dane-se Napoleão! - Exclamou mais alto do que planejava, atraindo para si olhares perturbados de mulheres de meia idade. Ela mesma era uma mulher de meia idade, dentro da sua juventude interrompida, infame e inescrupulosa. Viu-se refletida num espelho, de relance, e se achou muito bonita, mas gasta, gasta da vida, concluiu. Pegou Clarice, Laços de Família, decidiu-se por fim. Ignorando os olhares e acenos de reprovação, dirigiu-se ao caixa , onde pagou pelo livro sob os cuidados retóricos, e forçados, de uma vendedora muitíssimo preocupada com sua comissão.
Saiu, os saltos estalando atrás de si, esbarrou num jovem homem, de cabelos negros, sobrancelha espessa e sorriso enviesado, ele segurou-a, por um instante, pousando seus olhos cobiçosos no xadrez da existência carmim.
- Desculpa - Sentenciou por fim. Enquanto os olhos dele a fitavam demasiado...
- Não, não! Tudo bem, não foi nada. Qual é o seu nome ?
- Gilda.

15 de ago. de 2010

Genericamente falando.

Desde o movimento feminista no Brasil, ou melhor, desde que ele teve voz ativa, implantou-se na sociedade patriarcal brasileira ( bem como, suponho, ter acontecido em outras sociedades patriarcais ao passarem pelo mesmo movimento ) uma nova entidade, um novo tipo de " homem moderno " com um novo ponto de vista sobre a mulher .
Esse " homem moderno " aprendeu tudo a risca com o papai, e quer que sua esposa seja uma mulher moderna, também . Só que ser moderna do ponto de vista desse especime masculino é ser uma workaholic de dia - o que é bom para as despesas familiares - e uma Amélia de noite e aos fins de semana. E a jornada dupla, vira tripla, e quando os bebês chegam não é mais uma jornada numérica é uma jornada de infindáveis frustrações. Isso porque o lar e sua sanidade/integridade depende de nós, e então nos vemos enredadas numa questão de gênero, que genericamente falando é um conflito de interesses socio-culturais de uma sociedade provinciana de valores deturpados .
A questão começa a ser implantada na infância, certa feita falei que gostaria de ser mãe solteira numa reunião de família e vi - sem entender - algumas taças caírem de mãos sobressaltadas, hoje vejo tudo com pesar.
O mesmo pesar com o qual encaro que na minha idade - Dezoito anos, sim senhor - existem meninas que falam em pegar diploma para ser dondoca, sim, e outras que falam em casar cedo, outras muitas que se vulgarizam pensando estar protestando contra algo que sequer compreendem e mais algumas que tem medo de falar, porque mulher que fala é mal vista, é extravagante e logo recebe uma pecha que denigre sua imagem pública.
E quando eu me pergunto onde isso tem suas raízes e porque eu sou " diferente ", todas as respostas levam a educação. Uma educação diferenciada, me fez uma mente diferenciada, uma vez que não foram repassados para mim valores de uma conjuntura moral falida dentro de seus próprios dogmas.
Agora eu pergunto a vocês, e quem é favorecido com essa depredação moral ? Porque uma vez reprimidas as mulheres com voz ativa e continuada a cultura das " Raimundas " ( As quais eu diria ser: feias de mente e bonitas de bunda, pernas, olhos, cabelo e todo o resto - que realmente não importa se não for acompanhado de sapiência. ), nós temos um empobrecimento de todas as camadas da sociedade, porque, as Raimundas também serão mães. E nós não precisamos citar exemplos, todo mundo conhece crianças vulgarizadas desde cedo. Essas serão mães também .
Olha, dona sociedade. Há que se cuidar do grão, porque frutos podres são irreversíveis, grãos podem ser tratados.

14 de ago. de 2010

Sou por acaso.

Abri os olhos devagar, o sol inundava o quarto, o sol inundava a mim. Levantei com a preguiça, dancei com ela entre lençóis amassados e fui pé-ante-pé viver mais um grande dia.
Maior que os dias, são as pessoas, constatei ao me deparar comigo mesma virtual no espelho, invertida em pensamentos sobre o tempo, e que tempo !
Quanto tempo faz para nós ? Conferi o post it colado no espelho e sorri, peguei a bolsa, o óculos e saí.
- Hey, vida, espera, eu quero uma carona ! - Anuncei enquanto saltitava rua à fora.

E fui .

Picolé de Chuchu ;

Fria e Indigesta !