15 de dez. de 2015

Esperança,

Estou no alto do décimo segundo andar do ano, na sacada e sem qualquer proteção para o que está por vim. Cada um dos doze lances de escada, com trinta ou trinta e um, só uma vez vinte nove, degraus subi com sangue nas pegadas, alguns degraus com sangue nas mãos, provoquei dores e mortes no caminho, mas também morri algumas vezes.
Cada pegada ensaguentada que subi, vertia o sangue dos meus próprios pés e algumas vezes subi de joelhos, com lágrimas manchando a maquiagem, que agora, aqui no alto já não existe. Cheguei aqui, no alto, na sacada, no clímax buscando a Esperança, aquela menininha de olhos muito verdes e algum alento para essa dor que não cessa de brotar.
Passei pela porta dupla e reluzente do dezembro confiante, mas agora tão próxima da sacada vacilo ao sentir o vento que me açoita, uivando.
E nada da menina.
Praguejo contra ela e a culpo por quase tudo que não foi: Porque você não esteve comigo esse tempo todo? Onde você estava? Não viu que eu me sentia sozinha? Grito para o silente NADA numa expectativa vã e como resposta o contínuo e mordaz silêncio.
E então surge de lugar nenhum a velha alquebrada e solene, passa por mim nos seus passos comedidos e me sorri, há um lampejo de qualquer alegria de outrora nos seus olhos que por instantes me contamina e me faz esquecer da dor, de toda dor, e então a velha some de vista, para o além-sacada.
A sigo, subitamente imbuída de coragem que nunca tive.
Quase já não posso respirar, o vento corta o meu rosto e meu peso pouco significa na queda livre, antecipo a dor instantes antes de desmaiar.
E então nada.
A doçura incompreensível do nada. Nem um baque, dor nenhuma, acordo embalada nos braços de uma menininha de grande olhos verdes, pretinha, seu cabelo crespo esfregando-se com docilidade no meu rosto, já não mais cansado e dorido.
Era então um Ano novo.
Quimera-se próspero.
Me levantei e preparei-me para nova subida, não sem as memórias de erros e dores, mas sem o peso do medo.




Dedicado especialmente para : Ana Elisa Sousa.

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