27 de mai. de 2025

Time after time

 Mãe, bom dia, lembra quando eu acordava no domingo e ia para sua cama para continuar dormindo com você até cansar de dormir e acordar antes de você e ficar te encarando pelo tempo exato que você ia descobrir que eu estava olhando e ia abrir os olhos e dizer “bom dia, mamãe” a senhora não tem nome para mim, é a minha mãe, minha cabaça ancestral, o sagrado corpo que me trouxe ao mundo. Eu nunca lidei bem com o sagrado, por isso posso ter sido inconveniente, mas você é a melhor do mundo para mim, isso mesmo, com tudo tudo tudo, mesmo quando me magoa, mesmo quando eu te magoo, não existe nada maior que isso no mundo. Eu não sou extraordinária para todo mundo, talvez ninguém seja. Sei que a senhora é, para mim a senhora é a evidência do extraordinário, nenhuma escolha depois poderia ser não fosse o milagre da senhora não só ter me parido como ter me adotado e ter me adotado todas as vezes que eu fui uma estrangeira, ninguém jamais vai poder ocupar o seu lugar, mãe. 

A intimidade de saber que existi dentro de alguém antes mesmo de existir dentro de mim.  Todas às possibilidades 

Home is wherever I'm with you

 Tinha aquela garota que eu conheci na escola, a história dela era de arrepiar. Ela era a mais ousada entre nós, foi ali a primeira vez que vi alguém que realmente tinha borboletas na cabeça, ali tão perto ela traçava um plano infalível, tinha rock da decada de oitenta e toca a deselegância pequeno burguesa de sonhos de cercas brancas, eu não a culpo, naquele momento todas nós éramos um pouco assim, mas ela se atrevia sempre a pensar fora da cerca, bem mais longe do que a gente, ela queria desbravar um mundo inteiro, ir à lugares, conhecer pessoas, se preparou a vida toda para falar. Iria viver fugindo, uma andarilha, dona de todos os rumos, sem depender de ninguém sozinha e em paz, mais sozinha do que em paz. Desde esse dia ela decidiu que ela andaria por aí com uma bolsa grande e nela haveria tudo que era necessário para fugir a qualquer instante, era e é a maior hedonista, boa vivân que eu jamais conheci, experimentava tudo, queria beber a vida todinha quando não a queria queimar inteira num fogo só. a maior sede do mundo junto com a maior necessidade do mundo de correr, as vezes é porque o caminho dela era o trânsito, por sua existência de passarinho um dia uma gaiola a encontrou, queria tanto fugir, que como o Nemo se perdeu na própria fuga, caminhos vão e vem e caminhos tortos escreveram no céu sob a fumaça a história de mundos que só nós duas conhecemos e desbravamos, coisas que compartilhamos e que nunca foram iguais, mas em algum momento por sorte ou destino se encontraram e aí alguma coisa de amiga ficou comigo quando o passarinho ficou além da fuga e às vezes, num dia bonito de sol ela vem me visitar e coloca uma margarida na minha fossa. Sei que já fui uma canção estridente de pássaro no galho daquela árvore que ficava perto da sua janela, mas são assim as mulheres pássaros - insuperáveis. Deitam até nas costas das baleias e dançam com elas o agradável balé do percurso que agora pode se estender aqui, não além mar, as vezes o caminho é in, não out mesmo. Tem gente que é casa mesmo. 

26 de mai. de 2025

Eu quero ver o pordosol lindocomoele só,

 Ai que ofício dispendioso esse de acreditar que sou poeta, poetisa ou pórtica qualquer da palavra. Agora mesmo tenho vontade de acreditar e medo de acreditar no poder (da palavra). Acreditando assim entre o medo e o movimento e medo aqui (até das pontuações que é coisa de fora e não de dentro) significa a paralisia, que entendo quê: os ansiosos são todos devoradores de palavras, falamos pelos cotovelos na esperança de que aquilo que diz de si, pelo menos diz. Nem tudo diz coisa alguma e o sentido que faz as vezes é só sol (tem uma poesia, aquela sol fazia só não fazia sentido) (meu eterno maravilhamento hiperbólico desse coração bobo bola balão que lembra os lugares da infância que tive e que não tive e insiste em buscar sentido, pertencimento e conexão genuínas para que a vida tenha graça e também eu que me autorizei a querer o que eu quero e não só o que me quer ou querem. Eu que sou e que poderia escolher por mim mesma depois de tanto tempo quero é me saber sentindo. Estou colocando agora mesmo esse hedonismo fetichista da experiência para jogo. Porque eu não aceito ser infeliz e para isso eu preciso viver uma vida que faça algum sentido e rompida a expectativa narcísica de que seja para o outro me atrevo a querer pra mim e acreditar possível. Tão possível que para fora e posso existir. Eu quero ter uma vida interessante e aprendo com a vida interessante a ter disciplina e cuidado e com o cuidado aprendo a ter corpo e aprendo de novo a querer. Desejar. Sabe como é? Afinal, só eu sei as esquinas por que passei, mas o Djavan que as inventou para mim, para eu poder passar na minha ficção hiperbólica de eu. 

Picolé de Chuchu ;

Fria e Indigesta !