Memorizo o céu de uma cidade qualquer enquanto dirijo, prometo para mim mesma não esquecer. Capturo a cena e retorno para ela, constatando que ainda lembro. Coleciono memórias de um passado distante e costuro-as no presente para que ele não perca o sentido. Às vezes acho a vida pouca, quando assim, quero correr mais que as pernas para longe, para a vida muita. Às vezes dirigindo me sinto mais importante que o dono da preferência na rua, me aterrorizo de mim constatando que também sou mesquinha e logo me perdoo, repetindo pra mim mesma que sou pessoa - tenho direito às minhas falhas - brindo as minhas contradições e sigo segurando o volante da minha vida. Carrego dores que não deixam de existir, não importa qual caminho eu pegue, vícios e multas de mal comportamento têm me seguido obstinadas. Tudo me convida a parar, apreciar a vista, encosto o carro, respiro fundo, visito o céu de meu registro mais antigo e bordo no presente o assombro do mais novo. Não quero motorista, quero dirigir livre. Às vezes eu gosto de estar dentro de mim, às vezes queria estar no outro. Uma vez me disseram que Ferrari não tem adesivo, nunca me imaginei Ferrari, estou mais para ferrada mesmo, mas cubro meu corpo de desenhos e palavras que são apenas minhas e que só eu escolhi para mim, faço do meu corpo automóvel e estrada, me percorro e me percorrendo não me esgoto.
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